As festas juninas são, junto ao período carnavalesco, as comemorações mais queridas dos nordestinos, que passam o ano esperando pelo momento de preparar a decoração, vestimenta, os alimentos, bebidas, músicas, brincadeiras e fogueiras. A origem da celebração que homenageia Santo Antônio, São João e São Pedro, no entanto, é desconhecida por muitas pessoas que vivenciam as festas.
A professora de história Cristiane Pantoja explicou que as festividades de São João, Santo Antônio e São Pedro datam do século XV e têm nas manifestações culturais de música e dança não apenas homenagens, mas também agradecimentos aos santos.
“A própria quadrilha é uma manifestação de dança, mas antes de tudo, agradecimento aos santos. Como fator de nossa cultura, a miscigenação também aparece nos elementos juninos. Indígenas e africanos dão sua contribuição na alimentação, na arte e na música”, contou a professora.
Severino Vicente da Silva, professor do Departamento de História da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), conta que a tradição se iniciou na Europa, quando o cristianismo começou a dominar os povos francos e germânicos, tidos como “bárbaros”, e tentar apagar suas crenças implantando o catolicismo no lugar.
“Eles tinham seus deuses e era uma noite longa, fria a de 23 para 24 de junho, e era uma noite sagrada. Eles iam para as florestas, lá pelo o século V e lá eles acendiam grandes fogueiras em homenagem para ao seu deus da fertilidade, Deus Chifrudo. No lugar da festa do Deus Chifrudo, dia 24 de junho, dia do solstício, se imaginou uma festa ligada ao primo de Jesus, no dia do nascimento de São João”, explicou Severino.
O historiador Paulo Henrique Carneiro destacou o fato de que as celebrações dos povos pagãos na Europa também tinha o objetivo de espantar maus espíritos que pudessem atrapalhar suas colheitas, e que não era incomum a Igreja Católica incorporar costumes de outros povos a seus calendários.
“Assim como a festa junina foi introduzida ao calendário festivo católico, outras festividades também foram introduzidas às celebrações cristãs. Essa era uma prática muito comum da Igreja Católica, realizada como uma forma de tentar facilitar a conversão de povos pagãos ao catolicismo”, disse ele.
O professor da UFPE também contou que, ao colonizar o Brasil, foi na região do nordeste que os portugueses devotos dos santos juninos se instalaram a princípio, fato que explica a força da tradição na região. Além disso, segundo Severino, houve também uma mistura de tradições europeias e indígenas que deram às festividades o formato que conhecemos hoje.
“O pessoal que veio da europa para o Brasil começou a fazer fogueiras nos engenhos e coincidiu com a tradição dos índios, que é a questão do milho, que tem a colheita em junho. O Nordeste é Brasil pra valer desde 1530. São Paulo é Brasil desde 1600 e alguma coisa. O Rio Grande do Sul é Brasil em 1700 e alguma coisa. O que eu quero dizer com isso? As mais profundas raízes da formação do Brasil estão aqui no Nordeste. Os alemães, poloneses, italianos, quando chegam aqui no Século XIX não têm essas tradições”, explicou o professor.
Apesar da força que as festas juninas têm no nordeste, há celebrações em outras regiões, que resguardam algumas diferenças em relação às festas nordestinas. Segundo o historiador Paulo Henrique Carneiro, um dos pontos em que há diferenças é na gastronomia.
“A forma que nós nordestinos usamos raízes como batata, macaxeira e inhame, o milho cozido ou assado na fogueira, ou a diferença que a gente dá para os nomes das comidas. Por exemplo, a canjica aqui no nordeste é conhecida como curau no sudeste, ou a canjica do sudeste é o munguzá do nordeste”, contou ele.
Mesmo dentro do nordeste, é possível perceber que as festas juninas têm mais força em cidades do interior que em regiões litorâneas onde em geral se encontram as capitais dos estados. Para a professora Cristiane Pantoja, o ritmo mais lento com que ocorrem mudanças nas cidades interioranas pode ser uma das razões para esse fenômeno.
“Um dos entendimentos é saber que no interior as manifestações são menos afetadas pelas mudanças. Claro que acontecem e se renovam, mas com menor rapidez ou intensidade. Temos os povoados sendo criados a partir das Capitanias Hereditárias que são faixas litorâneas até o interior, mas quando falamos em maior ou menor intensidade de mudanças tradicionais, a tendência é modificar com menor rapidez e intensidade”, disse a professora.
O professor Severino segue uma linha de raciocínio semelhante ao apontar o caráter rural das festas juninas nos períodos colonial, imperial e no começo da República, indicando também o fato de que as celebrações precisaram, com o tempo, se adaptar à urbanização do país. “Nas capitais você fica caricaturando o rural, era uma festa rural de um Brasil rural que agora urbanizou-se. O Brasil moderno que você conhece começa a nascer no século XX”.
Sobre a música, que é uma marca fortíssima do São João, especialmente com ritmos como o forró, o baião e o xote, Severino aponta as décadas de 1940 e 1950, a era do rádio, como o momento em que esses ritmos passam a ter fama e reconhecimento através da carreira de Luiz Gonzaga, que começou no Rio de Janeiro.
“Vamo pegar o Baião. Luiz Gonzaga foi para o Rio de Janeiro, começa a tocar lá se torna um sanfoneiro famoso, mas quando começou ele tocava as músicas de lá, até que um dia alguém perguntou porque ele não tocava coisas de sua terra. Quando Luiz começou a tocar o que aprendeu com o pai foi modificando e adaptando o Sertão ao Rio de Janeiro e quando os nordestinos escutaram, se lembraram da sua terra”, disse ele.